Rodrigo, o paciente

"Nem tentem", eu disse. "já ouvi essa piada antes."
"Qual piada," disse um deles, o Prático.
"Ele está a falar daquela piada,"disse o outro, o Filósofo "aquela sobre médicos. Ele acha que nós somos médicos"
"E não são?" perguntei.
Eles tinham batas brancas, a sua própria ala num hospital.
"Isto não é uma piada Rui," diz o Prático.
O meu nome não é Rui.
O meu nome também não é Rodrigo, já que falamos nisso, mas havemos de lá chegar.
"Temos uma boa e uma má notícia."
Não me consigo lembrar de qual era a boa notícia.
A má era má. Estou a morrer de uma coisa da qual ninguém alguma vez morreu. Algo de fantasticamente novo! Apesar de tudo e estranhamente, estava-me a sentir em óptima forma. O meu Coração está óptimo e os meus Pulmões limpos. Os meus sinais vitais estão vitais. Nada me está a comer, a corroer, a cercar ou a atacar. Não tenho Bloqueios, Entupimentos ou Escorrimentos. Os meus níveis estão óptimos. As minhas contagens estão bem contadas. Feitas as contas tudo apontava para que ainda não estivesse feito.
Em óptimo estado para um homem morto, diziam eles. Dias, talvez meses, até um ano. Quiçá mais de um ano. Era dificil de calcular. Pelos seus cálculos não se pode fazer cálculos.
"Terá de viver como todos os outros," diz-me o Filósofo, "só que menos"
"Só que mais, quer o senhor dizer", digo eu
"Não há tempo para jogos de semantica, faria melhor em preparar-se" diz o mecânico
Chamam-me Rodrigo e estou a morrer radicalmente de entediosidade acelerada. Tendo em conta o meu predicamento, decidi pecar. E por pecar eu quero dizer divertir-me à grande, ver o que isso dá.